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O Cardeal e o Espírito Santo
17.10.2012

Em 2003, o Cardeal Eugenio de Araújo Sales (1920 – 2012), na condição de Arcebispo Emérito do Rio de Janeiro, veio a Natal, quando recebeu uma série de homenagens. Atendeu convite da Escola Doméstica, onde foi recepcionado sob o estilo próprio de Noilde Ramalho, estilo discreto, fidalgo e caloroso. À mesa, durante o almoço, tive a honra de ficar defronte ao Cardeal, o que me deu a feliz oportunidade de conversar, de maneira informal, com aquela figura humana iluminada, que eu sempre respeitei e tanto admirei. No decorrer dessa visita à ED, disse-lhe que ele iria receber uma carta com solicitação de um texto/depoimento sobre a vida de Noilde Ramalho, para constar em livro biográfico que eu estava a escrever sobre a notável educadora. No seu depoimento, constante no livro "Noilde Ramalho – Uma História de Amor à Educação", lançado em 2004, o Cardeal ressaltou o valor da família como célula originária do bem-estar social – mesmo princípio propulsor da ideia de Henrique Castriciano para implantar a educação feminina no RN, em 1914 –, e enfatizou o papel da Escola Doméstica nesse mister. Sobre a insigne mulher biografada, disse: "Há pessoas, como Noilde Ramalho, que avançam em idade e em virtudes. (...) A vitoriosa Escola Doméstica é a coroa que Noilde porta consigo".

Reitero o que escrevi em artigo pelo transcurso do 90º aniversário do Cardeal Eugenio Sales: a vinda do papa João Paulo II a Natal, em 1991, fato histórico para o nosso Estado, se deve ao prestígio desse Príncipe da Igreja, um dos norte-rio-grandenses e um dos prelados do Brasil mais ilustres e respeitados em todos os tempos. Hoje, relembro-me de uma exposição de telas de artistas plásticos do Rio Grande do Norte, realizada em 1988 no Rio de Janeiro, na sede da Academia Brasileira de Letras, sob a batuta do professor Antonio Marques. Lá, estavam vários artistas e os seus trabalhos – entre os quais o grande Dorian Gray –, na casa símbolo máximo da cultura do país, com o aplauso e a presença do Presidente Austregésilo de Athayde. O evento fez parte das celebrações dos trinta anos da UFRN, época em que exerci o cargo de Reitor, e só se efetivou pelos préstimos e o entusiasmo de Otomar Lopes Cardoso, com o pleno apoio de dom Eugenio.

Não vou repetir o quanto já foi dito e se escreveu sobre o Cardeal Eugenio de Araujo Sales, depois da sua passagem para a vida eterna, ocorrida em 09 de julho de 2012. Sua biografia, seus feitos humanos, seus méritos de líder religioso, enfim, as marcas das benesses deixadas por onde ele passou já foram expressas nas diversas mídias do país e até do exterior. Vi e li muito dessa produção em louvor da memória de dom Eugênio, porém, há um artigo que me chamou a atenção: "O simbolismo da pomba", escrito por José Narcélio Marques de Sousa, publicado no "Jornal de Hoje". O autor refere-se à pomba branca que pousou sobre o esquife de Eugênio Sales e fez vigília ao corpo do Cardeal, durante os funerais. Narcélio concluiu que houve uma clara manifestação do reconhecimento divino, a "acolhida do Pai à alma nobre do filho Eugenio de Araujo Sales". Além de me alinhar a essas conclusões, ouso uma pergunta: teria sido uma mística mensagem, na forma simbólica do pássaro do Espírito Santo? Fui reler o Sermão do Espírito Santo, do Padre Antônio Vieira: "O Espírito Santo – diz Cristo – vos ensinará tudo o que eu vos tenho dito. Notai a diferença dos termos e vereis quanto vai de dizer a ensinar. (...) Só o Espírito Santo ensina, porque alumia por dentro". Ainda com a lembrança daquelas imagens inesquecíveis da pombinha branca, asas abertas sobre o corpo inerte do Cardeal, ouso mais uma vez perguntar: teria havido, naquele instante de emoção, o desígnio de relembrar os dizeres e os exemplos de dom Eugenio Sales, a fim de que se transformem em ensinamentos, por meio do Espírito Santo?