Herois ou mártires? - Centro Universitário do Rio Grande do Norte - UNI-RN
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Herois ou mártires?

Em conversa com um amigo, disse-lhe que as equipes de saúde de UTI deviam merecer atenções iguais às que são atribuídas aos tripulantes de aeronaves. E expliquei que os riscos do excesso da fadiga humana para a segurança de voo são os mesmos para os cuidados médicos aos pacientes graves.  Sabe-se que o ser humano, em especial a mente humana, precisam alternar períodos corretos de trabalho e de repouso, a fim de manter um estado de alerta capaz de garantir ações rápidas e efetivas, no momento certo.  Porém, na “prática a teoria é outra”, ou seja, existem muitos fatores que interferem para a não adoção de medidas tais como essas, para as equipes de saúde. São medidas fáceis de defender e difíceis de aplicar, até mesmo em tempos normais, quanto mais em tempos tão adversos como os que vivemos nos dias atuais.

Na vigência dessa terrível pandemia, talvez a pior de todas as pestes que já acometeram os seres humanos, estou sempre a pensar na angústia dos profissionais que atuam na linha de frente do combate à Covid 19.  Em texto recente na Folha de S. Paulo, o médico e professor Carlos Magno Fortaleza, da Unesp, escreveu:  “Desconsolados, assustados, cansados, muitas vezes acreditamos ter chegado ao limite.  Nós vamos continuar, porque não há opção. (...) Atravessaremos noites transportando pacientes, conduzindo atendimentos de urgência e velando obsessivamente pela função respiratória de cada pessoa afetada pela peste.” O autor, então, cita o escritor Samuel Beckett (1906-1989), irlandês, Prêmio Nobel de Literatura de 1969, quanto à dúvida que aflige pessoas quando estão no limiar entre desistir ou manter a luta, e conclui:  “E assim, exauridos, oscilando entre a fé e o desconsolo, no limite das nossas forças porém movidos pelo inescapável senso do dever, vamos em frente. (...) Sim, é preciso continuar”.

 A enfermeira Cristiane Lamarão, de Porto Velho, é um exemplo das agruras que dominam os profissionais da saúde que trabalham em UPAs ou em hospitais voltados para o atendimento aos pacientes com Covid 19.  O caso dela é de extremo sofrimento, pois ela perdeu o próprio marido, o enfermeiro Raimundo Lamarão, 51 anos, contaminado pelo vírus no dia a dia da profissão.  Viúva, agora ela não conta com o esposo para dividir os cuidados dos filhos de 17, de 15 e de cinco anos.  Cristiane lança um grito de alerta:  “Vi colegas morrendo.  Chego a intubar até quatro pacientes em um plantão.  Perdi meu marido, estou com depressão”.

 A Covid 19 pegou o mundo de surpresa, pois a atenção à saúde não é prioridade  em quase todo o planeta. No Brasil, apesar do avanço do SUS, o semi-caos que se instalou nas UPAs e em muitos hospitais, com equipes sob intensa pressão física e psicológica, leva-nos à questão:  esses profissionais são verdadeiros herois, mas, em alguns casos, são verdadeiros mártires(?)

Daladier Pessoa Cunha Lima

Reitor do UNI-RN

Artigo publicado na edição desta quinta-feira (25/03/2021) do jornal Tribuna do Norte



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