Amor à profissão - Centro Universitário do Rio Grande do Norte - UNI-RN
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Amor à profissão
09.01.2014

Há muitas vantagens morar em um lugar onde o verde está ao seu alcance, a qualquer hora do dia. O contato com a natureza, em especial quando é cuidada com carinho, faz bem à saúde física, mental e espiritual. Em crônicas anteriores, já disse que desfruto dessa benesse, pois sempre acordo com os cantos dos pássaros, respiro ar filtrado por vegetais, vejo de perto o esplendor de algumas árvores, além de dispor de certas frutas sadias vindas deste pequeno pomar. Por outro lado, manter tudo isso em ordem dá despesa e dá trabalho. No meu caso, o gramado que circunda a casa é o principal gargalo da manutenção. Já pensei em substituir parte da grama por um piso seco, mas desisti, apesar das fortes tentações. Fiz a previsão de que iria me arrepender, quando buscasse o verde e visse somente o cinza, quando buscasse a vida e encontrasse apenas a aridez da pedra.

Para manter esse microcosmo particular, tenho sempre um auxiliar pronto para as tarefas de aguar, podar, aparar, adubar, colher, tirar o mato e outras funções correlatas. Tudo isso tem de ser feito de forma constante, assídua e cuidadosa. Certo dia, um desses auxiliares, no afã de bem exercer sua função, cortou todas as pequenas plantas da flor xanana, algo que me constrangeu bastante, mas aceitei suas réplicas, pois não lhe havia dado corretas orientações. Também relembro de uma podação radical feita por um operário especialista nesse ofício, em uma árvore plantada e cuidada por minha mulher. Ela ficou brava, e precisei mediar e acalmar o conflito. Ao contratar de novo o mesmo operário, ele me perguntou: "Doutor, sua senhora me deixa entrar na sua casa?".

De todos os auxiliares – já foram vários – para essas tarefas de cuidar do jardim e do pomar, Paulo é o titular absoluto. Depois de mais de 20 anos nesse labor, ele se aposentou e foi auferir o ócio com o qual sonhava. Vez por outra chegava lá em casa, quando dizia que estava bem de saúde e com vontade de voltar ao batente. Alguns meses atrás, com a saída de Pedro, jardineiro de transição – Pedro e Paulo, nomes de tão louvados santos, unidos aqui em nobre missão –, convidei-o a retornar às antigas tarefas, pois todos assim queriam, a começar pelos seres vivos vestidos de verde. Não preciso dizer qual foi sua resposta.

Há poucos dias, Paulo me disse que a máquina de cortar grama deixara de funcionar. Pelo longo tempo de uso, resolvi comprar uma nova, mas, ao chegar à loja, o vendedor me falou que não tinha da mesma marca, e, de forma honesta, recomendou procurar primeiro o conserto, com a sugestão de uma oficina na Av. Bernardo Vieira. Pelo endereço, vi que se tratava da oficina do meu amigo Arnaldo, que conheço desde a década 1960, quando atuei como médico na cidade de Santa Cruz. Na manhã de 31 de dezembro passado, levei a máquina para conserto, quando tive a alegria de rever o amigo no seu local de trabalho. Aos 87 anos, Arnaldo continua saudável e alegre. Disse-me que faz tratamento, há vários anos, de doença da próstata. No meio da conversa, ele revelou: "Doutor, não tenho medo de morrer, mas lamento ter de me ausentar um dia deste lugar aqui", e apontou para uma singela bancada, na qual atua com maestria em induzidos de motores. Arnaldo passou o comando da empresa para um dos filhos – alguns já formados –, mas não arreda da labuta à qual ele tanto se dedica; e sente prévia saudade – se assim for possível entender – da arte que pratica, em face da inevitabilidade da morte.

Devotos do trabalho – como eu também sou –, Arnaldo e Paulo provam que exercer com amor uma profissão, em qualquer idade, pode ser uma boa fonte de saúde e da alegria de viver.


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